terça-feira, 7 de abril de 2015

Artigo de Opinião: "A questão da redução do número de deputados"

A redução do número de deputados é uma questão recorrente junto da opinião pública. Em momentos de maiores dificuldades económicas e sociais, a questão é sempre colocada em cima da mesa por todos aqueles que não resistem à tentação, neste e noutros assuntos, de “surfar” o instinto antiparlamentar de alguns setores da opinião pública.
A verdade é que a instituição parlamentar nacional cometeu alguns erros – nomeadamente nas décadas de oitenta e noventa a propósito da criação das subvenções vitalícias e dos subsídios de reintegração parlamentares - que criaram, junto da população, a perceção de que os parlamentares produziram, para seu usufruto, um sistema de privilégios injustificados. Isto tendo em conta as enormes dificuldades com que se debate a grande maioria da nossa população e os baixos rendimentos da esmagadora maioria dos nossos trabalhadores e pensionistas.
Em 2005, a Assembleia da República e a Assembleia Legislativa da Região Autónoma dos Açores colocaram – e bem – um ponto final a este conjunto de privilégios (o mesmo não sucedeu na Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira, que continua a manter as subvenções vitalícias).
A atividade parlamentar deve ser vista como um serviço cívico, de caráter temporário, à nossa comunidade. Não se deve esperar retirar da mesma qualquer privilégio ou vantagem. Pelo contrário, o que é expectável – mas não desejável - é que prejudique, de alguma forma, as carreiras profissionais dos deputados, que durante o período de serviço cívico têm de secundarizar ou abandonar a sua atividade profissional. De qualquer forma, trata-se de uma atividade temporária que, em nenhum caso, se deve transformar numa espécie de empregoe muito menos representar um meio para adquirir privilégios temporários ou permanentes.
É por isso que considero que os deputados e os agentes políticos em geral devem agir com responsabilidade em relação aos seus compromissos com os eleitores. Neste artigo abordo, a título de exemplo, a questão do número de deputados a eleger no âmbito das eleições legislativas regionais.
Existe, nesta matéria, uma rede de interdependências e de pesos e contrapesos que torna muito difícil mexer com êxito nesta legislação. Qualquer alteração à lei eleitoral tem de ser aprovada por uma maioria qualificada de 2/3 no nosso Parlamento e ser depois submetida à apreciação e votação na Assembleia da República. Ou seja, nenhum partido está em condições, por si só, de alterar a lei eleitoral. A minha preocupação foi, nesta matéria, evitar o aumento do número de deputados a eleger para o nosso Parlamento e, se possível, obter mesmo uma redução significativa. Nesse sentido fui o primeiro, no final da legislatura anterior, a apresentar uma alteração à lei eleitoral que impedia o aumento, por via do significativo aumento do número de recenseados, de 57 para 64 deputados.
Nesta legislatura, fui o único deputado que apresentei uma iniciativa legislativa concreta para diminuir, de forma significativa, o número de deputados (de 57 para 41). Não foi possível obter os apoios necessários para aprovar a iniciativa (os tais 2/3) e por isso optei por apresentar uma outra proposta que visava fixar o número máximo de deputados nos atuais 57 e impedir, assim, um novo aumento, estimado em mais 7 ou 8 deputados. Esta última proposta foi aprovada por unanimidade no nosso Parlamento. Mesmo assim tive de insistir e utilizar uma figura regimental que obrigou a uma apreciação e votação imediata na Assembleia da Republica, que entretanto tinha colocado na gaveta dos esquecidos a legislação eleitoral que lhe tinha sido remetida dos Açores. Tudo isto representou uma autêntica Odisseia. Podia ter optado, como fazem tantos outros, por cruzar os braços, mas insisti e acautelei os interesses do nosso sistema democrático. Por sua vez, o Parlamento dos Açores agiu com o sentido responsabilidade que o caracteriza e distingue na maioria esmagadora das vezes. Na próxima legislatura, se ainda por cá andar, voltarei a tentar obter uma diminuição significativa do número de deputados.
(publicado no jornal Açoriano Oriental de 30/03/2015)